domingo, janeiro 31, 2010

Por que você me tirou para dançar? - 191

Eu estava quieto, parado no canto do clube cheio... mas você surgiu e sem rodeios me tirou para dançar. Eu desconhecia os passos. Não sabia se pegava em sua mão, se encostava em seu rosto, se acariciava o seu cabelo. Você tentou me ensinar como se dançava, estava paciente... Já fazia um tempo que eu admirava o modo de você levantar os braços para o ar, celebrando o insano desejo de cantar, dançar, pular... Por que você me tirou para dançar? Quando eu já parecia te acompanhar no mesmo ritmo, você largou a minha mão. Por que você me tirou para dançar? Algumas vezes, eu me sinto perdido no meio da pista... Mas reconheço os caminhos pelos quais ando... e retorno, sigo um fluxo que me parece ser mais justo... e encontro alguns atalhos. Em lugares que nem imaginaria que seria possível ter tantos segredos...

P.S: "The way you look at me/ the way you touch me/ The fire in your eyes/ (makes) me swear, makes me shiver inside/ There's nothing I can do about it" ("Shining Star)

sábado, janeiro 30, 2010

Free to Decide - 190

Cansei de usar a razão. Não me venha com números, cálculos incalculáveis, teoremas já existentes... Eu quero mesmo bagunçar o meu já extremado coração. Com sílabas indecifráveis, jogos de esconde-esconde, misteriosos desafios... você seria capaz de encontrar a senha que me leva às minhas decisões. Eu estou prestes a jogar para escanteio esta minha tentativa de agradar sempre, de não falar que não quero estar ao lado de rostos mascarados ou de ouvir o barulho intenso, quando, de fato, eu quero olhar o teto do seu quarto branco e tentar saber porque você não desenhou estrelas... Eu sou livre para decidir... e, por mais que falem que eu tomo decisões precipitadas ou que demore a dizer "sim"... eu quero mesmo é viver intensamente. Mesmo que isso signifique apenas tocar, de leve, o seu rosto com meus dedos limpos...

P.S: "It's not worth anything more/ Than this at all/ I'll live as i choose/ Or i will not live at all" ("Free to Decide", do The Cranberries)

quinta-feira, janeiro 28, 2010

Ameaça - 189

Ela confessou que queria ser uma ameaça. Terrorista, provavelmente. Queria te surpreender no meio da rua, mirar sua boca e te beijar. Sim, sim, entre tanta gente chata e reunida. Entre aquele que um dia a esnobou. Ela queria ameaçá-lo com sílabas doces, mas gestos grosseiros. Pegar em seu cabelo, cortar sua barba, arrancar o seu coração. Pulsando... sangrando... queimando de calor. Ela quer ser uma ameaça. Permitir ser uma louca desvairada... Uma ameaça. Terrorista. Com bombas no coração para te mostrar como ela vive intensamente. Uma ameaça. Um grande barulho... uma ameaça. Indicada aos mais loucos desejos... ao dela! Mas, por enquanto, ela é silenciosa... ainda assim uma ameaça.

P.S: "Sou fera, sou bicho, sou anjo e sou mulher/ Sou minha mãe e minha filha, /Minha irmã, minha menina/ Mas sou minha, só minha e não de quem quiser/ Sou Deus, tua deusa,meu amor" ("1º de Julho", interpretada por Cássia Eller)

segunda-feira, janeiro 25, 2010

Vinte minutos - 188

A mão suava. O menino esperava a resposta imediata. Não tinha saída. Era aguardar a crueldade da verdade ou a fantasia da mentira. Ele tremia. Olhava para o lado direito e para o esquerdo. Tinha de ter certeza de que contava rostos conhecidos... Um, dois, três... Cinco minutos. Por dois segundos ou mais, ele chegou a pensar que falaria seus segredos menos íntimos: aqueles mesmos que ele já não consegue disfarçar quando escreve em seu diário de páginas manchadas. Dez minutos. Ele já não tremia tanto. Já embarcava, talvez, no barco misterioso. Fazia um calor insano. Alguns graus a mais, alguns quilômetros percorridos... ele não tinha noção da exatidão da distância vencida... e pronto: já não era calor, já não era a multidão... era simplesmente uma vontade de colocar o mundo em seu carrinho de compras e abraçar, sobretudo, você.

P.S: "Ainda é válido, mesmo que tenha acontecido quando eu estava inconsciente. É duplamente válido, porque a mente consciente muitas vezes comete erros e se deixa seduzir pela pessoa errada" (trecho do conto "O Quintal Compartilhado", de Miranda July)

sábado, janeiro 23, 2010

Cara suja - 187

Apesar de todas as diferenças, foi você quem, neste exato momento, eu escolhi amar. Essas palavras puderam ser lidas no rosto dele. E são tantas as diferenças... Eu observo o futuro. Você brinca com o meu presente, tentando tirar conclusões de minhas reações quase impensadas. Eu não entendo como fui me apaixonar por você. Você mal me olhou no dia lotado. Estava escuro, lembro eu. Ou, ao menos, não era possível observar com exatidão os meus lábios que queriam se aproximar do seu. Como um passe de mágica. Como um filme adolescente no qual, quando o mocinho e a mocinha se beijam, as luzes focam sobre eles. Talvez seja preciso crescer, mesmo contra a minha vontade. É preciso esquecer a agenda em um ponto de ônibus, dormir menos e, consequentemente, sonhar menos... Vou pegar a minha máscara.

P.S: "Be a good girl/ You've gotta try a little harder/ That simply wasn't goog enough/ To make us proud" ("Perfect", da Alanis Morissette)

quinta-feira, janeiro 21, 2010

Cara limpa - 186

Quando o relógio apagou a luz, o menino percebeu o quanto estava confuso. Sem saber que horas eram, ele decidiu, assim mesmo, olhar para trás e saber qual o caminho que você fazia ao retornar para casa. Desviaria a trajetória? Escreveria, na rua, novos mapas? E você enviaria o endereço correto? Já faz um tempo que ele procura o seu número perdido entre tantos pontos desconexos de uma rua sem saída... Já obteve algumas pistas, mas, quase sempre, errou a combinação, a conexão... E, por essa razão, o menino resolveu se esconder na casa abandonada, onde ninguém pensa que mora alguém. O pior é que você, descaradamente, manda, quase sempre, uma pomba-correio.

segunda-feira, janeiro 18, 2010

( ) - 185

Você é um parênteses. Foi isso o que a moça ouviu do outro lado da mesa. As palavras saíram silenciosamente, mas ela conseguiu decifrá-las. Essa era a intenção. No entanto, ela, na realidade, queria ser um ponto. Não o final. Ou, de repente, vírgulas, que servem para somar experiências, sonhos e vontades mil. Entre elas, esta que eu guardo entre parênteses, olha só que irônico, quando eu penso em seu nome ou quando você aparece lá do outro lado e levanta a mão, chamando-me para perto.

P.S: "It's meeting the man of my dreams/ And then meeting his beautiful wife" ("Ironic", de Alanis Morissette)

sábado, janeiro 16, 2010

Quadrado -184

Sem ter ao seu alcance o livro que esquecera na praça, a menina passou a prestar atenção em rostos conhecidos. Queria, de alguma forma, se identificar com olhares e, por meio deles, relembrar fatos que fizeram com que chorasse ou até mesmo sorrisse. "O mundo é pequeno demais", pensou ela, ao avistar e abraçar o seu futuro namorado. Por outro lado, viu um garoto, com um lindo sorriso no rosto, passando ao seu lado. Ele parou, olhou para o céu, chegou a evitar que a lágrima caísse no chão - ela odeia a censura involuntária contra a lágrima!!! - e, cessado três segundos, olhou novamente a mensagem guardada entre tantas outras em sua agenda eletrônica... A menina seguiu em sua direção. O rapaz, já sem lágrimas nos olhos, apenas se divertia... sozinho!? Definitivamente, com a mensagem na mão, não!

quinta-feira, janeiro 14, 2010

Um conto aqui - 183

O rapaz não chuta mais latas pelas ruas. No entanto, continua cantando as suas canções favoritas. O rapaz não chora mais por qualquer coisa. No entanto, se emociona ao pensar que você chegará a qualquer momento. O rapaz não fecha mais os olhos ao dançar na pista de dança. No entanto, dá uma gargalhada ao perceber que ninguém o observa. O rapaz não conversa com qualquer um. No entanto, imagina diálogos intermináveis contigo ao som da (nossa) banda favorita. O rapaz não dá bola para os demônios. No entanto, ignora os anjos que querem que ele não arrisque. O rapaz não beija mais tanto. No entanto, é capaz de se prender em um longo beijo... o de sempre! O rapaz não gosta de lentidão... No entanto, nas últimas semanas, percebe que um passo curto pode representar a conquista do seu espaço.

P.S: "Hoje eu vou brincar de ser criança, E nessa dança, quero encontrar você, Distraído, querido, Perdido em muitos sorrisos, Sem nenhuma razão de ser/ Olhando o céu, chutando lata, E assoviando Beatles na praça, Olhando o céu, chutando lata, Hoje eu quero encontrar você" ("Distração", de Zélia Duncan)

segunda-feira, janeiro 11, 2010

Oito meses - 182

Ao abrir os olhos, notei, por meio das páginas de minha agenda secreta, que não rabiscava o seu nome há oito meses em textos sobre a terra, a água e o ar. Foi aí que percebi que eu deveria, de fato, localizar o seu esconderijo em seu mapa... ou melhor, eu deveria desvendar a sua trajetória e, em um ponto estratégico, colocar um desvio que a levaria para os nossos causos besteiras. Com você, eu me sinto à vontade. Com você, eu quero ouvir os detalhes dos beijos, dos encontros, das roubadas. Com você, eu quero simplesmente estar presente. Em uma tarde de calor, de frio, com cerveja no copo ou simplesmente buscando, entre uma e outra rua, um vento no rosto.

sábado, janeiro 09, 2010

Escrevi - 181

Você descobriu onde eu guardava o meu livro favorito. Letras grifadas, frases destacadas... quase um nome escrito. O seu. E, dessa maneira, você tentou juntar as peças e montar um enorme labirinto. Onde você se esconderia? Onde eu tentaria, desesperadamente, apagar todas as sílabas soltas? Eu escrevi tantos rabiscos... quase pichei meu desespero na parede do quarto branco. Não era para entender nada... Assim, pare de olhar no fundo dos meus olhos...

quarta-feira, janeiro 06, 2010

Vida - 180

Chovia. E o rapaz enfrentava a água que desabava do céu com um velho guarda-chuva. Tentava se lembrar do dia em que pediu para sair com ela. A pergunta saiu baixinha... ele tinha medo de que ela ouvisse. Assim, foram para o meio da rua, brincaram de amarelinha, dançaram a música preferida de ambos na piscina, interpretaram a canção cafona e sorriram. Ainda houve tempo para observar o movimento na praça vazia, se afogar em um copo vazio, reler uma carta perdida e perceber que, na cabeça do rapaz, já surgem outros rostos, outras bocas, outros sonhos.

P.S: "I´ll take you out for a date/ Anytime, anywhere/ Name the place I´ll be there/ Bungee jumping/ I don´t care" ("Life", de Desire)

domingo, janeiro 03, 2010

Penhasco - 179

Ela não sabe exatamente quando decidiu pular do penhasco. Não era uma tentativa de suicídio. Longe disso. Era apenas uma maneira de, lá embaixo, respirar um outro ar, um outro gosto, um outro cheiro. Foi-se o tempo em que queria ficar no topo da montanha, encostando a mão no céu. Agora, porém, está disposta a encostar, de fato, os pés no chão, na grama molhada, e olhar para frente. Ela vê uma flor diferente... não perfeita, como já imaginaria que seria... apenas diferente. Isso, ela sabe, já basta.