sexta-feira, maio 30, 2008

Ocupado - 84

Fiquei sabendo que você tentou falar comigo... amigos confessaram que você perguntou por mim. Vestido de blusa e cachecol, contaram-me que ficou perdido no meio da rua, esperando, talvez, que eu aparecesse pulando, dando-lhe um susto. Estou longe, incrivelmente longe. Enquanto você ingeria a bebida amarga e se protegia da chuva gelada, eu tomava Sol na praia. Você, mais uma vez, fingia ententer quase tudo? Desculpava-se por aceitar, como sempre, as dúvidas da menina colorida? Fui embora. Não apareci. Estou ocupado...

quinta-feira, maio 29, 2008

Tchau - 83

Desculpe-me se não te escrevi antes. Não tive tempo. Eram muitas lembranças para jogar no lixo. Desculpe-me se estou lhe dizendo somente agora que agora estou na Austrália. Resolvi abandonar carreira, canudo, a minha cama, a minha agenda (não leia!) e o meu espelho e encarar uma nova folha em branco. O ar daqui é respirável, mas ainda não sei te dizer qual o cheiro. No entanto, alegra-me saber que não é o mesmo que você inspira. Calma, isso não é uma declaração de ódio: a questão, esta remoída em minha cabeça tantas vezes, é que preciso de outros objetos para deixar de pensar tanto em você.
Aqui, tudo é muito lindo... a arquitetura é fabulosa... e a natureza... e eu tão acostumado com o concreto de São Paulo - é possível realmente distinguir as cores na planície australiana. Bom, acho que você percebe neste cartão-postal: trata-se da estrada que desemboca em Perth, cidade onde pretendo passar alguns dias. Não sei o meu endereço... e acho que nunca terei um. Logo, desculpe-me, não perca o seu tempo escrevendo para mim... possivelmente serão cartas que nunca chegarão às minhas mãos. Sendo assim, te dou o prazer de me ler, me separar ou me rasgar...

quarta-feira, maio 28, 2008

Acorda, acorda... - 82

O dia ainda está escuro. As cortinas do quarto dela ainda ajudam a fingir que não é hora de acordar. E talvez nem seja mesmo. Mas uma mão chega repleta de carinho e lhe entrega o copo quebrado. Ela não se corta. Não se machuca. Agradece. Bebe a vitamina e volta a sonhar com ele, que, mais uma vez, confessa: "vou atrás dos meus sonhos... você me espera?". Ela não sabe se são frases declaradas ou aquelas já decoradas de uma peça de teatro alternativa. Pouco importa... se espreguiça, vê a hora e observa outro recado, agora na cabeceira da cama... "I love you for the rest of my life"...
P.S: "Geme de loucura e de torpor, Já é madrugadaAcorda, acorda, acorda, acorda, acorda, Mata-me de rir, Fala-me de amor ("Joanna Francesa", de Chico Buarque)

segunda-feira, maio 26, 2008

(re)Visita - 81

Não costumo observar o passado com precisão, apesar de velhos discos e livros inacabados ficarem espalhados pelo chão do meu singelo quarto. Nada organizados, esses objetivos me levam a um passado tão presente. E, então, eu (re)visito o último choro e a próxima alegria... poucas vezes, confesso, compartilho tantos segredos. Uma letra de música... "eu disse a ela então"... e, assim, censuro as sílabas. Sumo do mundo real... mergulho em um transe... alguém me chama? Aumente o som, por favor? A minha música preferida toca...

domingo, maio 25, 2008

Lucinéias - 80

Seja de manhã ou em qualquer outro horário do dia, surgem elas, mutantes, plenas, felizes, inteiras. E, então, se transformam em diversas, cada uma com única voz, um singelo charme e vários sorrisos encantadores. Não é preciso abrir os olhos... basta doar o braço e, sem medo, ser guiado por elas... o destino será a alegria de viver a nossa própria maneira de ser. Morena, negra, ruiva, japonesa... não importa. A pele e os olhos falam muito mais do que a boca verbalizada... embora, quase sempre, um grito sonoro seja a resposta clara para a nossa satisfação. Não são necessárias palavras adocicadas... as palavras se encaixam perfeitamente. Começo, meio e fim... É a certeza de que o caminho é pleno, cheio, repleto... um brinde!

quarta-feira, maio 21, 2008

Acréscimos - 79

Quando eu achava que a conta já estava finalizada, você me pegou pelo braço. Olhei seu olhar espantado. Mas logo desviei e passei a prestar atenção no quadro pintado por mim. Nele, dois olhos redondos, incrivelmente negros, nos observavam. Seria você tão corajoso para me devorar? Seria eu tão corajosa para me aproximar mais de você, sentindo, assim, o seu abraço quente? Foi tudo muito surpreendente. Confesso!
(...)
Na calçada, você me fez chorar... não contei quantas lágrimas rolaram, mas eram aquelas que, há algum tempo, eu esperava que rolassem pelo meu rosto sorridente. Não havia testemunhas... ou melhor, havia sim: as suas pressões digitais na minha pele...
(...)
Ainda hoje, lembro-me de você. Já sem rancor, entendo-o melhor. O seu jeito de caminhar, o seu cheiro natural, o seu cabelo nos meus seios... e, quando isso acontece, esqueço as horas, os minutos, os segundos... já são acréscimos de um tempo presente e real.

P.S: "Não quero seu suor/ Quero seus poros/ Na minha pele/ Explodindo de calor" ("Sentidos", Zélia Duncan e Christian Oyens)

terça-feira, maio 20, 2008

Era o que procurava - 78

Era um pedaço de papel escondido no fundo da gaveta, que já desconhecia o pano úmido. Um papel quase amarelado. Uma escrita quase apagada pelo tempo. E, ali, onde ela menos esperava, a certeza que tanto procurava. Palavras de crianças pequenas... desconexas... os erros de português se manifestavam entre tantas letras de um alfabeto criado por eles e para eles somente. Leu e chorou igual a uma criança. A mesma que andava sem lenço e sem documento por ruas iluminadas pela Lua que a observava atentamente. Era hora de ir embora... pegou a sua mochila pesada, cheia de lembranças nas roupas sujas... verificou se a chave estava em seu bolso. Tinha certeza de que iria voltar... para escrever outras poesias.

P.S: desculpem-me pelo sumiço. Estive fora de casa por alguns dias e, teoricamente, longe do mundo virtual. Procurando, no meio de um mundo real, inspirações...

quarta-feira, maio 14, 2008

Eu nunca te amei, idiota - 79

A curiosidade predomina. Quero saber o que terá a dizer quando eu aparecer a sua frente com as mãos limpas. Vou mostrá-las para que você possa ver a minha trajetória até aqui. Aposto que você irá colocar a sua mão no bolso, tentando, a todo custo, esconder os caminhos confusos que você tem escolhido.
A verdade domina. Quero adivinhar para onde irá olhar quando perceber meus olhos inchados pelo fato de não dormir. Será que pensará que é de tanto chorar? Se sim, vou dar risadas... Não ficaria surpreso se eu te visse com aqueles óculos escuros comprados quando eu estava viajando. Você não vai se olhar... mais uma vez... E, então, diferente de tantas vezes que tentei te iluminar, vou querer notar como se comporta na completa escuridão. Se procurar bem, capaz que encontre minhas pistas...

P.S: "quero iniciativa e um pouco de humor" (Jota Quest)

segunda-feira, maio 12, 2008

Estrelinha - 76

Abri a janela na esperança de enxergar o brilho do seu olhar. A rua estava tão escura... não daria para descobrir o horário exato de sua visita. Ou pior: se iria, mais uma vez, me deixar esperando. Um telefonema. Um presente. Um sorriso. O seu olhar lá fora... O seu olhar no meu? Sinto-me tão desprotegido ao seu lado. E, mesmo que me abrace, continuarei sem armas. Da mesma forma que me livro do frio sob seus longos braços, sinto que os meus pés não ficam cobertos... Por que eu ainda acompanho seus rastros? Por que eu ainda sinto o seu cheiro no travesseiro?
O pior é que todas as frases prontas se tornam sílabas soltas no dicionário. Não teria tempo de juntá-las para explicar por que a chuva molhou o que se escondeu... Você não me concederia este tempo... Pode ir.

P.S: "O seu olhar agora/ O seu olhar nasceu/ O seu olhar me olha/ O seu olhar é seu/ O seu olhar seu olhar melhora/ Melhora o meu" (Paulo Tatit e Arnaldo Antunes)

domingo, maio 11, 2008

Quando você está... - 75

... eu fico preso, amarrado e não sei onde colocar as minhas mãos sujas. Se eu mostrá-las, você me indicará onde posso lavá-las? Quando você está, as coisas ficam menos transparentes. Poderia, alguma vez, ser mais claro e terminar uma frase? Prefira, por gentileza, a ordem direta... nada de inserir o verbo no lugar do pronome, que, se preferir, pode suprimi-lo. Assim, você finge que não fala de mim, e eu, claro, acredito. Acho que pode ser um bom acordo quando você está... descalço, sem saco, cansado. E, quando eu estiver disposto, contente, carente, eu sumo...

P.S: "E as coisas lindas são mais lindas/ Quando você está/ Onde você está" (Nando Reis)

sábado, maio 10, 2008

Sopro - 74

Não sei muito bem, mas, sem querer, o seu nome chegou aos meus ouvidos... e algumas histórias relacionadas a você também. Apesar da vontade de saber o que tem olhado em seu espelho fosse o suficiente para eu, inclusive, desenhar um cartaz no qual estaria a informação de que eu o procuro, queria, ao mesmo tempo, esquecer que você existe. Na verdade, tenho vontade que você, de alguma forma, desapareça de minha vida.
Esqueça o número do meu telefone, não envie mensagens pela internet e, muito menos, não perca tempo escrevendo uma singela carta de amor. Não quero atender ao telefone. Não quero ler os e-mails. Não quero derramar uma lágrima sobre o papel. Quando você vai me deixar em paz? Quando você será capaz de dizer que quer que eu suma de sua vida? Quando será capaz de dizer que me ama e que, por me amar, prefere se afastar?
Se antes eu queria que o tempo voasse, que a semana acabasse, hoje não sei se prefiro que tudo isso aconteça. Prefiro não encará-lo e dizer o quanto me magoa por deixar rastros para que eu possa te seguir...

quarta-feira, maio 07, 2008

Recado na geladeira - 73

Aposto que você não leu o recado que deixei colado em sua geladeira. Era, se não me engano, cinco horas da tarde de um domingo ensolarado. Não quis te acordar. Era um sono tão profundo. Com uma tinta invisível, fiz uma série de perguntas, que, aposto eu, como tem sido sempre, não teriam respostas. E eu, se antes pensava que era apenas uma característica sua, percebi que agora é um defeito. Defeito que eu cansei de suportar. Não quero uma biografia sua. Não quero saber o quanto você magoa as pessoas. No entanto, exijo o resumo do supra-sumo do seu prazer para que, quando eu te encontrar encontrado em algum lugar, eu possa, ao menos, conhecer o seu queixo. Aquele mesmo que, um dia, encostou no meu nariz... Lamento que tudo esteja se tornando um pretérito perfeito sem doses de presente.

P.S: "Nem tudo que é bom tem seu preço... Nem toda regra, exceção... Nem tudo que é dor me consome... Nem toda partilha é ao meio... Nem tudo que excita é desejo..." (Vander Lee em 'Seção 32', cantada lindamente por Mariana Baltar).

segunda-feira, maio 05, 2008

Manhã de frio - 72

Eu tentei te ligar hoje. Por sorte, você não atendeu. Eu, confesso, não saberia o que dizer. Liguei, pois o telefone estava perto da minha cama bagunçada, onde joguei os livros e aquele recado datado do ano passado. "Fui embora. Nos vemos em breve". Talvez, ao ouvi-lo no telefone, eu contaria como foi meu dia. Dia que acabou hoje de amanhã, ainda cedo, com o vento frio batendo no meu rosto. Os cabelos, que já disfarçavam o meu penteado, sofriam com o ar gelado. Eu, porém, não me preocupava. Caminhava rumo a qualquer lugar. Um lugar no qual não haveria ritmo combinado, apenas o barulho desconexo das minhas idéias...
Mas, calma, não me preocupo com isso... a bagunça dos meus pensamentos, de uma mente solta, tem sido útil. Aplico dúvidas em problemas. Erro certezas absolutas em notas de rodapé. Extraio o resultado final logo na primeira linha. Uso a borracha. Aponto o lápis. Deleto a palavra escrita na tela branca do computador. Utilizo o compasso para desenhar o Sol que me lembra o passado ao lado de minhas irmãs. Pego a caneta para desvendar as sílabas do caça-palavras... encontro-me intacto, inteiro...

sexta-feira, maio 02, 2008

Fingimentos - 71

Eu fingia que dormia. Mas observava o seu reflexo no espelho. Você tentava tirar os fios de cabelo que encobriam seus olhos. Você fingia que não observava o meu sono profundo. Acreditávamos em nossas mentiras. Eu o olhava com tanto medo de você descobrir minha farsa. E, pelo cuidado que você tinha para não fazer barulho algum, sei que queria manter aquela situação, o silêncio absoluto, para tramar um novo plano e, enfim, me beijar novamente.
Eu fingi que não percebi o seu rosto quase pesando sobre o meu. Eu fingi que não quis sua mão acariciando o meu sexo. Eu fingi que não senti sua boca na minha. Mas, na realidade, queria ressuscitar todos os músculos dos meus lábios para me achar... teus lábios são labirintos que atraem os meus...
"Dormiu bem, Juliana?", você me perguntou...